Pesquisar este blog

sexta-feira, 18 de março de 2011

Direitos do Trabalhador Doméstico

Sumário:
1. Introdução;
2. Evolução Histórica;
3. Direitos do Trabalhador Doméstico;
4. Inovações da Lei n.º 11.324/2006;
5. Conclusão; Referências
1. INTRODUÇÃO
Verificou-se que mesmo em ano eleitoreiro, em que se costuma distribuir benefícios em troca de votos, a categoria dos trabalhadores domésticos mais uma vez recebeu ampliações em seus direitos na base de "conta gotas", característica que sempre marcou a categoria.
Os trabalhadores domésticos, que representam uma das maiores categorias nacionais, possuem, segundo dados fornecidos pelo governo, mais de 6,7 milhões de trabalhadores, no entanto, têm apenas 1,6 milhões desse total laborando com carteira de trabalho assinada.
Desde sempre tivemos a categoria em questão como uma categoria especial, tendo em vista a natureza de sua atividade, já que os domésticos desenvolvem seu mister diretamente no ambiente residencial, em contato direto com os membros de uma determinada família e suas peculiaridades, não sendo incomum serem considerados membros da família. O empregado doméstico é aquela que presta serviços à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, e cuja força de trabalho não é utilizada como fator de produção (MARANHÃO, 1981)
Não raro, portanto, uma ação trabalhista movida por uma empregada doméstica se assemelhar à uma ação cível da área de família. Adianta-se, não pela natureza das verbas a serem postuladas, mas pelo desgaste provocado pela intervenção estatal entre pessoas que até outro dia se consideravam amigas, pelas feridas deixadas pelo rompimento da relação tão íntima que se dá num contrato de trabalho que envolve o trabalhador doméstico.
Destaca-se que em tais situações, na maioria das vezes, uma das partes (empregadora) se sente traída por ter confiado sua casa e sua intimidade a uma pessoa que na oportunidade pretende apenas auferir vantagens pecuniárias por meio da Justiça do Trabalho, e a outra parte (trabalhadora) por seu turno, acredita não ter tido seu valor reconhecido por todos os anos dedicados àquela família, vindo tais divergências serem o estopim para agressões verbais mútuas, chegando em alguns casos até mesmo às vias de fato.
Merece ser lembrado ainda que o empregado doméstico não é apenas o trabalhador responsável pela limpeza, manutenção de roupas ou mesmo cozinha de uma casa, sendo considerados empregados domésticos da mesma forma, a enfermeira particular, que presta serviços dentro do lar, o guarda ou vigia de residência, o motorista particular, o piloto de avião particular, o marinheiro de barco particular e ainda o caseiro de sítio ou chácara, dentre outros (PELEGRINO, 1993).
No cotidiano do empregado doméstico, verificam-se várias concessões entre trabalhador e empregador, que dificilmente se verificariam numa relação de empregado normal (celetistas), como o fato de alguns empregadores ajudarem seus empregados com roupas, mantimentos, utensílios e outros bens, bem como pelo fato dos trabalhadores desempenharem funções na casa que nem sempre correspondem com o objeto da contratação, como além de lavar, passar, cozinhar, também passam a cuidar de crianças e idosos, o que na maioria das vezes sequer é pactuado previamente.
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Quando se fala em trabalho doméstico imediatamente remete-se a um trabalho de pouco valor, prestado por pessoas com pouco preparo para atividades intelectuais e que somente desenvolvem tal mister pela impossibilidade de uma melhor colocação.
O pensamento acima é fruto da cultura brasileira, colonial, tendo em vista ter sido o trabalho doméstico nos primórdios prestado por escravos e servos. Somente após o século XVII, com o nivelamento entre o homem livre e o servo, por meio da intervenção da Igreja, o doméstico passou a ser um prestador de serviços, que trabalhava de forma autônoma.
Em termos de norma disciplinadora do trabalho doméstico, tem-se como pioneiro o Código Civil português de 1867, o qual inspirou outros diplomas, posto que completo acerca do tema. No Brasil, a primeira Lei a ser utilizada data de 13-9-1830, a qual era aplicada ao trabalhador doméstico pela sua generalidade.
Os primeiros trabalhadores domésticos brasileiros foram os escravos, e, após a abolição, temos o Código de Posturas do Município de São Paulo, tratando da atividade do "criado de servir", já que grande parte dos antigos escravos continuaram nas fazendas, apenas em troca de comida e moradia (MARTINS, 2004).
Posteriormente, o Decreto n.º 16.106/23, o Decreto-lei n.º 3.078/41, a Lei 605/49, a Lei 3.807/60 dentre outros, também trataram da atividade do doméstico, mas com certa dificuldade em discernir quem seria o trabalhador doméstico. Havia uma certa imprecisão de quais os direitos se aplicariam ao mesmo, pois se cuidava ora do descanso semanal, ora da questão previdenciária, mas sempre resguardando a atividade doméstica dentre outras estabelecidas, sem uma norma especial. Finalmente, em 11-12-1972, o trabalhador doméstico foi premiado com uma legislação que tratou especificamente de sua categoria, por meio da Lei 5859.
A referida Lei, agora, protegeria a pessoa física que, com a intenção de ganho, viesse a trabalhar para outra ou outras pessoas, no âmbito residencial e de forma não eventual, não sendo protegidos dessa forma o diarista intermitente (lavadeira, arrumadeira ou passadeira), ainda que comparecessem em dias determinados na semana, já que a Lei em comento trata do serviço de natureza contínua (CARRION, 2006).
Mesmo diante desse quadro, o trabalhador doméstico não foi contemplado com os mesmos direitos previstos para as categorias abrangidas pela CLT, tendo seus direitos limitado à sobredita Lei, tais como férias anuais de 20 dias úteis e benefícios e serviços da Lei Orgânica da Previdência Social, na qualidade de segurado obrigatório. A partir de então, a categoria continuou a buscar a ampliação de tais direitos, posto a observância dos parcos direitos trazidos por sua lei.
A expectativa cresceu com a constituinte de 1988, oportunidade em que os trabalhadores domésticos sentiram a possibilidade de após 16 anos terem finalmente outros direitos reconhecidos. A Constituição realmente trouxe no capítulo destinado aos Direitos Sociais, em seu artigo 7º, direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, bem como ampliou os direitos dos trabalhadores domésticos. No entanto, mais uma fez tais direitos não foram os esperados, já que apenas os direitos previstos no parágrafo único do mencionado artigo se estendiam aos trabalhadores domésticos, ficando os mesmos ainda sem o direito ao FGTS, seguro-desemprego, jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 semanais, dentre outros.
Em março de 2001, a Lei 10.208 acrescentou dispositivos à Lei 5859/72, conferindo ao trabalhador doméstico o direito ao FGTS, direito este, devidamente mitigado pela previsão de faculdade do empregador na inclusão do empregado no regime de FGTS.
Infelizmente, em nosso país, o que não é imposto não é devido, assim, o doméstico tem desde março/2001 direito ao FGTS condicionado à benevolência de seu empregador, o que vale dizer, de forma coloquial, "ganhou, mas não levou", já que poucos empregadores observaram tal direito desde então.
3. DIREITOS DO TRABALHADOR DOMÉSTICO
O trabalhador doméstico tem seus direitos disciplinados na Lei 5859/72 e no parágrafo único do artigo 7º, da Constituição Federal, dos quais destacamos:
- salário mínimo;
- irredutibilidade salarial;
- décimo terceiro salário;
- férias acrescidas de 1/3;
- descanso semanal remunerado;
- licença gestante e paternidade;
- aviso prévio;
- aposentadoria.
Como de costume no Brasil, voltou à baila a discussão acerca dos direitos do trabalhador doméstico e possíveis acréscimos em sua legislação, o que convenha-se, em ano de eleição, apresenta-se como um excelente palanque, já que esse contingente constitui um grande número de trabalhadores em tal área, devidamente acrescidos de seus familiares e possivelmente um considerável número de eleitores. Muito importante então, ano eleitoral em pauta, para os candidatos a governantes.
A Lei n.º 11.324 de 19 de julho de 2006 alterou vários dispositivos de legislações que tratam dos direitos dos trabalhadores domésticos, trazendo algumas novidades para referidos trabalhadores, bem como para seus empregadores.
Diante da máxima de que é pouco para quem recebe, mas muito para quem paga, após várias manifestações de líderes sindicais, congressistas oportunistas e outros interessados, os quais apenas pretendem a obtenção de uma grande quantidade de votos ou ao menos prestígio político, mais uma vez o trabalhador doméstico recebeu "por meio de conta gotas" a ampliação de seus direitos.
4. INOVAÇÕES DA Lei n.º 11.324/2006
Hodiernamente, após a Lei n.º 11.324 de 19 de julho de 2006, além dos direitos já reconhecidos, os empregados domésticos têm direito à:
- estabilidade gestante (da confirmação da gravidez até 5 meses após o parto);
- férias de 30 dias;
- seguro-desemprego;
- proibição de descontos dos gastos com alimentação, higiene e alojamento.
Em que pese o alarde acerca das inovações da Lei em comento, ao nosso ver não mudou muito o cotidiano do empregado doméstico.
No que tange à estabilidade, se tomarmos por base que a empregada doméstica podia ser dispensada após a cessação da licença-maternidade, ao contrário da empregada regida pela CLT, estamos diante de um grande benefício. No entanto, na realidade, nem todos os empregadores domésticos tinham conhecimento que a trabalhadora doméstica não gozava de estabilidade após o parto, razão pela qual, em decorrência de informações não precisas de alguns profissionais da área, bem como pelo temor em arcar com uma indenização, optavam em não dispensar suas empregadas. Assim, o direito agora reconhecido veio apenas chancelar o que se verificava na prática.
Concernente às férias, antes de 20 dias úteis e agora de 30 dias corridos, no mesmo diapasão, verificamos que a trabalhadora doméstica na prática acabava por gozar o período de férias como o trabalhador albergado pela CLT, na maioria das vezes também, pela falta de conhecimento da legislação pelo empregador, sendo certo que devemos concordar que 20 dias úteis se assemelha em muito com 30 dias corridos, não se apresentando assim como uma grande mudança.
No que se refere ao seguro-desemprego, tal benefício está diretamente ligado ao direito à verba fundiária, de sorte que o trabalhador doméstico receberá o benefício seguro-desemprego se tiver conta vinculada no FGTS, a qual fica a critério do empregador a inclusão do empregado ou não.
Quanto a eliminação da possibilidade de descontos com gastos com alimentação, higiene e alojamento, embora haja a necessidade de sopesar tais valores, os empregadores que se prestam a oferecer tais benefícios, em sua grande maioria, não se preocupam em cobrar, em decorrência das peculiaridades já apontadas do contrato de trabalho doméstico.
Se por um lado não se pode dizer que as inovações referentes ao empregado doméstico alteraram de forma substancial a vida do trabalhador, o mesmo não se pode dizer em relação ao empregador doméstico, para o qual foi mantido o abatimento no imposto de renda de recolhimento ao INSS (equivalente a 12% do salário mínimo).
5. CONCLUSÃO
Verifica-se que as medidas tomadas em relação ao trabalhador ora analisado, embora implantadas de forma abrandada em relação ao que fora proposto, o que marca há muito tempo a categoria. Se não se prestam a resolver os problemas de tais trabalhadores, ao menos não os agravou, posto que se percebeu em tempo que as propostas apresentadas pelos oportunistas de plantão, num primeiro momento, agradariam toda uma volumosa classe. Mas em um segundo momento, implicaria em demissões em massa e recuo em relação à novas contratações, face o temor que o empregador hodierno tem em relação à débitos trabalhistas.
Em que pese a retórica acerca de outros benefícios a serem deferidos nesse momento para os trabalhadores domésticos, venceu a eloquência para o impacto social que causaria tais medidas, sendo vetados o recolhimento obrigatório do FGTS, multa de 40% na dispensa imotivada e o salário família, sendo razões para o primeiro veto o fato de onerar em demasia o contrato de trabalho firmado com o doméstico, o que sem dúvida contribuiria sobremaneira para a informalidade e o desemprego e consequentemente inquinaria o objetivo constitucional do emprego pleno.
Para se vetar o salário família, o discurso pendeu para a inconstitucionalidade da aprovação, já que a alteração implicaria na inclusão do trabalhador doméstico no caput do artigo 65 da Lei 8213/91, o que afrontaria, dentre outros dispositivos constitucionais, o § 5º do artigo 195 da Constituição Federal, o qual veda a criação ou majoração de qualquer benefício ou serviços da seguridade social sem a devida fonte de custeio total.
Mesmo sendo verificada a ampliação dos direitos do empregado doméstico de forma parcimoniosa, constata-se que para o momento, numa análise mais acurada dos reflexos das propostas, foi o melhor caminho para a manutenção dos contratos de trabalho do doméstico.
REFERÊNCIAS
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 29a ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 1272.
MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 9a ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1981, p. 496.
MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do Trabalho Doméstico. 7a ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 176.
PELEGRINO, Antenor. Trabalho Rural. 6a ed. São Paulo: Atlas, 1993, p. 422.

Nenhum comentário:

Postar um comentário